21/12/2010

porém...

Nunca imaginei me atrair por alguém assim mais velho, barba grisalha, voz baixa, tamanho quase proporcional ao meu...como nunca imaginei gostar de uma pele branca, óculos de aro fino, sorriso tímido e boca intocável. É, eu nunca quis alguém assim tão certo das coisas, tão louco pra outras, com a personalidade tão incansável e uma carreira já consolidada. Jamais pensei em querer uma casualidade com um sujeito tão irônico e excessivamente questionador, sujeito esse que se faz de dramático e esquece o seu lado racional (pois sempre detestei homem dramático), o que o torna facilmente irritante. Quando eu poderia pensar em gostar de alguém com as mãos tão pouco atraentes e que me faz repensar a minha vida inteira em segundos? Pois bem, penso que, se esse homem existir, só tais defeitos me fariam encontrá-lo.

Alguém como você

É bem assim mesmo que penso. Penso em ter ao meu lado alguém igual à você, mas um alguém igual à você com a pele mais macia, com os ombros mais retos, as sobrancelhas mais delineadas e um corpo mais enxuto. Quero alguém assim igualzinho à você, mas um alguém assim igual à você de cabelos mais longos, cintura mais fina, coluna mais ereta e um sorriso mais brilhante. Penso em alguém bem assim como você, só que um alguém assim como você de inteligência mais refinada, com um sotaque menos aflorado, um busto menos avantajado e uns pés bem menores. Sempre quis alguém que pensa como você, só que alguém que pense mais que você, que pense além do que você e que fale menos; um alguém assim como você, mas de tamanho proporcional ao meu, com idade menos avançada que a sua, com os olhos mais claros que os seus, com uma profissão que não é a sua. Quero alguém que tenha o seu olhar, mas um alguém com o olhar mais sedutor, aliás, quero alguém bem assim como você, apesar de querer que você seja mais, sempre mais.

Conversa com o amor

Eu lhe procurei numa tarde quente onde o sol queimava minha pele e a minha alma clamava por alguns versos. Tais versos não podiam ser de um verão qualquer, tais versos nos sufocam quando não temos a palavra do outro que possa nos cercar e nos tomar de prosa antes calada. Somente a tua expressão me concede a inspiração, ou seria o inverso? Teu inverso me faz transpirar as palavras quase sêcas de uma tarde aparentemente nada chuvosa. Quando eu sumo, não quer dizer que eu me oculto, pois, contudo, lhe apareço nos versos narrados da boca pra fora, onde só o teu sussurro me bebe de satisfação.

Eu me sinto mais livre quando te enxergo daqui, como nos velhos tempos. Antes nós nos deixávamos em lágrimas, você lembra? Era tanta poesia do nada que até mesmo um ponto virava motivo de uma prosa. Éramos tão poéticos, tão soltos...um par.

Um par boêmio de pessoas incansáveis, que em todas as noites saía para vislumbrar no vento, momentos ainda mais esperados que aqueles antigos para nós. Até soluçávamos de tanto rir e somente uma vez soluçamos de tanto chorar, pois foi quando nos debruçamos a cantar alguns enredos que nos lembravam a nossa proximidade tão vulgar.

Aliás, motivos para chorar nós tínhamos, e muito. Sentamos certa vez em um barco lá em Parati e quisemos ficar quietos por uns minutos, logo então desatamos um nó e partimos para o choro enraizado em emoções profundas que só podia ter acabado em sorrisos. Foram lembranças vagas de uns pensamentos alheios, tivemos certeza que pensávamos quase igual e que nos debulhávamos por coisas bem próximas e algo bem incomum.

Nessa mesma noite, ainda de madrugada, expressamos a vontade num poema, este de causas ocultas, mas recheadas de oportunidades distintas. Sei que se lembra dessa noite, pois quando amanheceu o dia, você fez um poema sobre a tal madrugada e engendrou-me uma inspiração antes nunca tentada, foi sem receio, em disparada.

Quanta coisa nós já desbravamos, não? Poesia sem palavra, versos sem chão. Viagem desavisada, distância escorregadia, poemas em vão. Já até nos perdemos, dos detivemos, nos impressionamos, mas nos amamos, nos tivemos. Sim, nós tivemos, assim como agora, um ao outro, um pelo outro para o fim de uma prosa.